André Guedes desenha o cenário político de 2016

janeiro 26, 2016.

O jornalista André Luís Guedes Lima, especialista em relações governamentais que em Brasília acompanha o dia a dia do Congresso Nacional brasileiro, apresenta uma importante análise a respeito do cenário político que se descortina neste 1º semestre de 2016. O texto integral está transcrito a seguir. Contatos com o autor: andreguedes.relgov@gmail.com.

CENÁRIO POLÍTICO – O QUE ESPERAR DO INICIO DE 2016

O ano político de 2015 ainda não foi encerrado. Apesar do recesso forçado do Congresso Nacional, que terá suas atividades retomadas a partir do dia 2 de fevereiro, muitos temas em debate no fim do ano passado na Câmara dos Deputados e no Senado Federal permaneceram em alta durante as férias dos parlamentares e serão retomados na volta dos trabalhos legislativos. Com o Congresso Nacional de férias, o Poder Executivo federal ficou encarregado de ser o protagonista da política brasileira nos primeiros dias de 2016, além de ser o impulsionador de novos casos que serão incorporados aos antigos debates não concluídos em 2015. Um deles, refere-se a um dos ministros mais próximos da presidente Dilma Rousseff, Jaques Wagner, chefe da Casa Civil. Acusações de que o ministro recebeu recursos de uma empresa de fachada e atuou em nome da construtora OAS tiraram a paz do governo, que pretendia navegar em mares tranquilos até a volta das atividades legislativas. Parlamentares de oposição já articulam a convocação do ministro para explicar as acusações. A denúncia contra o ministro foi um golpe na estratégia traçada pelo Palácio do Planalto para os próximos três meses. No plano, a principal meta era continuar o movimento pela renúncia ou cassação do presidente da Câmara dos Deputados, Eduardo Cunha (PMDB/RJ). Agora, a estratégia deverá ser alterada e diminuir o foco em Eduardo Cunha e manter as atenções voltadas para a defesa do ex-ministro da Defesa, Jaques Wagner.

Com o Poder Executivo dependendo de outros Poderes para obter vitórias em batalhas, como ocorreu na decisão do Supremo Tribunal Federal (STF) sobre o rito do impeachment transferindo a decisão para o Senado Federal, perder um dos principais ministros por denúncias de corrupção pode complicar ainda mais a situação de Dilma Rousseff. Em virtude disso, a ordem no Planalto é blindar o ministro chefe da Casa Civil. O episódio faz Eduardo Cunha passar a respirar com aparelhos em sua agonia. Apesar do pequeno alívio, a situação do presidente da Câmara é grave dentro da própria Casa. Mesmo com o Planalto diminuindo sua condição de atuar no processo contra ele, Cunha tem visto aumentar o descontentamento de seus pares e os constantes pedidos para que ele renuncie ao cargo de presidente. O clamor pelo afastamento tende a ser maiores a partir de fevereiro. Com o processo de investigação contra Cunha aberto no Conselho de Ética, as pressões serão mais intensas mesmo tendo ele o direito de defesa e as ações da sua aliada tropa de choque.

De acordo com o tramite regimental, Cunha apresentará a defesa e o relator, deputado Marcos Rogério (PDT/RO), ouvirá testemunhas. O conselho tem 60 dias úteis para votar o parecer final do relator e a Câmara 90 dias para votar o parecer final do conselho, contados a partir de 3 de novembro, data de instauração do processo. Mesmo com os prazos em andamento, Eduardo Cunha tenta, por artifícios do Regimento Interno da Câmara (RICD), anular a decisão de abertura do processo por quebra de decoro via Comissão de Constituição, Justiça e de Cidadania (CCJC). O colegiado ainda vai deliberar sobre a solicitação. Outro assunto que ficará nos holofotes da política brasileira neste início de ano é a troca dos líderes partidários na Câmara dos Deputados, em especial a definição do Partido do Movimento Democrático Brasileiro (PMDB). Esse é também mais um tópico não encerrado da política no ano de 2015.

O atual líder do PMDB, Leonardo Picciani (RJ), foi deposto por seus correligionários da liderança do partido na última semana de atividades legislativas e conseguiu reverter a situação no apagar das luzes com o auxílio do governador do Rio de Janeiro, Pezão, que exonerou dois secretários para retornarem à Câmara e assinarem a lista para reconduzir Picciani ao cargo. A estratégia foi exitosa. Agora, o então deposto e atual líder já afirmou o desejo de continuar no comando da sigla em 2016 mesmo com o partido dividido. Nos bastidores, é perceptível que o desejo de Picciani de se manter líder se resume a uma guerra de forças entre os defensores do mandato da presidente Dilma Rousseff e aqueles favoráveis ao impeachment. No entanto, quem for o líder do PMDB não será líder de um partido na prática, uma vez que apenas uma corrente seguirá suas orientações. A corrida pela liderança do partido também traz uma característica praticamente exterminada no PMDB nos últimos anos: a renovação. Leonardo Picciani foi indicado por uma corrente que se manteve no poder do partido da Câmara por mais de 10 anos. Ela teve o ex-deputado e atual ministro do Turismo, Henrique Eduardo Alves (RN), na liderança por vários anos, enquanto Michel Temer presidia a Casa. Depois, Henrique passou a presidir a Casa e Eduardo Cunha virou líder. Na sequência, Cunha virou presidente e Picciani assumiu a liderança. Apesar de ter seguido a sequência, Picciani prega que representa, neste momento, a contrariedade a essa corrente e que quer uma nova roupagem para o PMDB na Casa. Por outro lado, surgem nomes de jovens e experientes deputados para assumir a liderança do partido.

Um deles é Leonardo Quintão (PMDB), que foi indicado líder quando Picciani foi deposto, mas passou poucos dias no cargo. Outros dois são os deputados Newton Cardoso Jr (MG) e Hugo Mota (PB). Mota pode entrar na disputa como amuleto de Eduardo Cunha com o objetivo de levar a votação para um segundo turno dificultando a recondução de Picciani. Cabe destacar que são apenas desejos e cogitações dos candidatos, uma vez que tratando de PMDB tudo pode mudar até mesmo antes de Renan Calheiros e Michel Temer fazerem as pazes. A troca de farpas entre Calheiros e Temer em dezembro de 2015, em virtude do episódio da destituição do líder do partido na Câmara, rachou o PMDB, que até então era dividido apenas na Câmara dos Deputados. A briga dos dois caciques pemedebistas parece não ter sido amenizada durante o natal e ano novo, já que após as festas de fim de ano Temer iniciou uma peregrinação aos diretórios estaduais do PMDB para não perder o controle do partido, do qual preside, para o presidente do Senado, Renan Calheiros e seus aliados. As arestas ainda não aparadas devem ser usadas pelos candidatos às lideranças do PMDB na Câmara. A expectativa é de que o atual líder use Renan Calheiros para angariar votos. Já o candidato que fizer oposição a Picciani tende a ter o apoio do vicepresidente da República, Michel Temer. O deputado Eduardo Cunha deve entrar, mesmo enfraquecido com a sua situação perante seus pares, na briga. Ele, que indicou Picciani para liderança à época que eram aliados, já atua nos bastidores para enfraquecer o deputado fluminense e apoiar outro nome. Com tudo que envolve o PMDB nos bastidores, a partir desta semana a única certeza que se tem é o aumento do trânsito dos parlamentares do partido em uma Câmara dos Deputados tomada apenas por seguranças e zeladores. Outras lideranças na Câmara

Da mesma forma que tem ocorrido nos últimos anos, a tendência para as lideranças Na Câmara dos Deputados em 2016 é a recondução de alguns líderes partidários na Câmara dos Deputados, além de nomes indicados sem muita experiência na atividade legislativa ou com pouca expressão no Congresso Nacional. Outro fator que pode ser usado pelos partidos nas escolhas é o retorno de nomes que já foram líderes de suas bancadas. Alguns partidos já deram indicações dos nomes que vão compor sua liderança. Um deles, é o PSD que reconduzirá o deputado Rogério Rosso (DF) ao cargo. O PSDB também já definiu seu líder, o deputado Antônio Imbassahy (BA), que foi líder de sua bancada em 2014. A recondução dos atuais líderes também pode acontecer no PTB e PPS. No PTB, o deputado Jovair Arantes (GO) ocupa pela oitava vez o cargo e pode ser mantido neste ano. Já Rubens Bueno (PPS/PR) é líder de sua bancada desde 2011. DEM e PT devem eleger seus líderes logo no início de fevereiro. Partidos como Psol e PCdoB tem adotado rodízios na liderança, mas somente em fevereiro os novos nomes devem ser confirmados. A sucessão de Cunha Eduardo Cunha tem afirmado e reafirmado que não deixará o comando da Câmara dos Deputados antes da data de encerramento do seu mandato. No entanto, sua condição ficará insustentável, caso o Conselho de Ética vote pela perda do mandato do presidente. Nesta hipótese uma renúncia de Cunha fica bem provável, o que movimentará ainda mais a Câmara dos Deputados a partir de maio até o início do segundo semestre. Prevendo essa possibilidade, o Palácio do Planalto já tem consultado sua base para indicar um nome que concorrerá à Presidência da Câmara, uma vez que nenhum nome do PT tem sido visto como possível postulante ao cargo.

Da mesma forma, Cunha e seus aliados procuram um nome para sucessão. Por fora corre a oposição em busca de um nome independente para apoiar. Alguns parlamentares já tem aparecido como postulantes ao cargo. André Moura (PSC/SE), um dos aliados e fiel escudeiro de Eduardo Cunha, pode ser um deles. O eterno líder do PTB, Jovair Arantes, também já teve seu nome sondado, mas ainda sem força. O indicativo é de que ele permaneça mesmo na liderança do seu partido. O único que tem colocado seu nome em conversas e entrevistas é o pemedebista pró impeachment, Jarbas Vasconcelos (PE). O ex-governador e senador pernambucano é visto com simpatia por muitos deputados, em especial os da oposição. Por fim, não é descartada a possiblidade de Leonardo Picciani desistir da liderança do partido para tentar a presidência da Casa, caso o governo consiga contornar suas crises e apoia-lo. As bancadas no Congresso Nacional em 2016 A criação e registro de partidos no Brasil em 2015 causou mudanças nas bancadas no Congresso Nacional, em especial na Câmara dos Deputados. Duas novas siglas, a Rede e o Partido da Mulher Brasileira (PMB) iniciam o ano com parlamentares em seus quadros. O PMB inicia sua começara a sua trajetória legislativa em cenário nacional da mesma forma do PROS, SD e PEN. Os partidos atraíram parlamentares insatisfeitos com suas antigas legendas, que utilizaram as novas siglas para não perderem o mandato, e depois eles foram desembarcando, em sua maioria, por conflitos ideológicos. O PSD, do ministro Kassab, também sofreu com perda de muitos deputados pós fundação, mas ainda mantém um bom número. Para 2016, o PMB já conta com 21 deputados federais e um senador. Já a Rede, terá cinco deputados e um senador.

Além dos novos 21 deputados do PMB, outro fato importante para 2016 na Câmara foi a redução do número de deputados do Partido dos Trabalhadores (PT). Desde a posse dos parlamentares em fevereiro de 2015, dez deputados deixaram o partido seguindo para outras legendas. Cabe destacar que novas mudanças nas bancadas partidárias podem ocorrer com a fundação do partido Raiz Movimento Cidadanista pela deputada Luiza Erundina (PSB/SP). O partido será lançado oficialmente no dia 22 de janeiro e começará a coletar assinaturas para registo no Tribunal Superior Eleitoral (TSE). Se o registro for concedido, Erundina pode levar muitos parlamentares para seu partido pelo fato de ter bom tramite no Congresso e admiração de muitos deputados e senadores. Já no Senado Federal, em relação a dezembro de 2015 não ocorrerão muitas alterações na composição da Casa. As únicas novidades, que ocorreram no início de janeiro, foram as saídas do senador Álvaro Dias do PSDB, que ingressou no Partido Verde (PV) e do senador Hélio José, que trocou o PSB pelo PMB. Com isso, os dois partidos passam a ter um senador cada. No final do ano passado alguns senadores trocaram de partido após uma decisão do STF considerar que o mandato de senador é do parlamentar e não do partido. A senadora Marta Suplicy foi a primeira a utilizar esse direito e trocou o PT pelo PMDB. A expectativa é de que mais dois senadores, utilizando a mesma decisão, deixem o PT para ingressar em novos partidos. Paulo Paim (PT/RS) e Walter Pinheiro (PT/BA) tem demonstrado irritação com a condução do partido e desde o segundo semestre de 2015 começaram a votar contra o governo na maioria das matérias. Quanto às mudanças de senadores, que são normais no Senado Federal para que suplentes possam assumir, o número foi reduzido. Os senadores, que assumiram vagas de titulares ocupantes de ministérios, permanecem no cargo.

[caption id="attachment_2717" align="alignleft" width="300"]Congresso Nacional em Brasília Congresso Nacional em Brasília[/caption]

Com isso, a Casa retornará às atividades legislativas com os mesmos parlamentares que finalizaram 2015.  Bancadas na Câmara dos Deputados PARTIDO NÚMERO DE DEPUTADOS PMDB 67 PT 59 PSDB 53 PP 41 PR 34 PSB 34 PSD 32 PTB 22 DEM 21 PMB 21 PRB 20 PDT 17 SD 15 PSC 13 PCdoB 12 PPS 10 PROS 9 PSOL 5 REDE 5 PV 5 PHS 4 PTN 4 PTdoB 3 PEN 2 PSL 2 PTC 1 PMN 1 SEM PARTIDO 1 TOTAL 513  Bancadas no Senado Federal PARTIDO NÚMERO DE DEPUTADOS PMDB 18 *PT 13 PSDB 10 PSB 7 PP 6 PDT 6 DEM 4 PR 4 PSD 3 PTB 3 PRB 1 PSC 1 PPS 1 PCdoB 1 REDE 1 PMB 1 PV 1 TOTAL 81 Obs: * Na bancada do PT, o senador Delcídio do Amaral, preso por envolvimento na Lava Jato, ainda está como senador. Caso ele venha a ser cassado o PT perderá uma cadeira e o PSC terá mais um senador. Pedro Chaves, suplente de Delcídio, é filiado ao PSC. O clima tranquilo do Senado dará espaço ao caos A tranquilidade que o Senado Federal viveu nos últimos dias de 2015 tende a ser esquecida na volta dos trabalhos legislativos. A Casa, que encerrou o ano votando matérias normalmente e sem polêmicas, deverá entrar no mesmo ritmo caótico da Câmara dos Deputados. A operação Lava Jato, que antes mirava apenas o senador Fernando Collor (PTB/AL), agora chega a outros senadores, inclusive o presidente da Casa, Renan Calheiros. Um retorno ao ano de 2007 pode acontecer no Senado, quando os senadores paralisaram as atividades pedindo a renúncia do mesmo Renan da presidência, acusado de envolvimento com um traficante de influência. O clima instalado do outro lado do Congresso no lado do tapete verde deve ocupar também o salão azul. Outro senador que engrossa a lista é Edison Lobão (PMDB/MA). Durante o recesso parlamentar, seus sigilos bancário e fiscal foram quebrados também por suposto envolvimento na operação Lava Jato. Essa lista pode ter novos nomes até março e isso deve colocar o Senado Federal em uma situação difícil até mesmo para debater e votar o processo de impeachment da presidente Dilma Rousseff, uma vez que agora é a Casa que dará a palavra final. Outro tema importante, que pode agravar mais a situação do governo federal, é a paralisação das votações em plenário. A presidente Dilma Rousseff conta como certa a apreciação de medidas para estimular a economia e colocar as contas do governo nos eixos, como por exemplo a aprovação da CPMF. Inclusive, ela sancionou o Orçamento da União com recursos vindo da CPMF. O caos poderá atrapalhar mais uma vez os planos e estratégias do Palácio do Planalto. O Impeachment O processo de impeachment contra a presidente Dilma Rousseff será o carro chefe das atividades no Congresso Nacional neste primeiro semestre de 2016.

A Câmara dos Deputados, que havia escolhido a Comissão Especial responsável por analisar o impeachment, terá que fazer nova escolha, em virtude da decisão do STF. O Supremo considerou ilegítima a condução e a forma de eleição que confirmou a chapa de oposição vencedora para compor o colegiado. Além da guerra travada entre oposição e base do governo, a harmonia entre os Poderes será mais uma vez colocada em cheque. A Mesa Diretora da Câmara dos Deputados vai solicitar ao STF a revisão de sua decisão, uma vez que considera uma intromissão do Poder Judiciário nas ações do Legislativo. A perspectiva em torno desse debate é a possibilidade de troca de farpas entre os presidentes da Câmara, Eduardo Cunha, e do STF, Ricardo Lewandowski, além do travamento das atividades nas Comissões Permanentes da Câmara dos Deputados. Para Cunha essa paralisação não é uma má ideia, já que o processo que enfrenta no Conselho de ética não andaria. Cabe destacar que a responsabilidade do processo neste momento é da Câmara, mas a decisão está nas mãos do Senado Federal. Essa é mais uma decisão do STF contestada pela Mesa Diretora da Câmara. Segundo os ministros da suprema corte, o Senado Federal será o responsável pela decisão de cassar ou não Dilma Rousseff, um artifício que não foi utilizado no processo contra o ex-presidente e atual senador por Alagoas, Fernando Collor. A definição na liderança do PMDB nas duas Casas Legislativas e as pazes entre Renan Calheiros e Michel Temer podem ser decisivos na condução do processo.

Dilma Rousseff torce para um PMDB divido, pois sabe que ele parcialmente unido, já que é impossível unificar o partido na totalidade, pode ser um avanço em sua cassação. A Guerra PT X Dilma Dilma Rousseff travará batalhas em 2016. Uma delas é contra o seu próprio partido, insatisfeito com decisões que ela tem tomado. O presidente do PT, Rui Falcão, tem feito críticas abertas à presidente e a tendência é que elas continuem, caso não ocorra avanços na economia. Nos bastidores, Rui Falcão trava uma guerra com o grupo de Dilma. Lulista, ele tem a missão de enfraquecer nomes ligados à Dilma que podem ser candidatos à sucessão com o objetivo de deixar o caminho livre para Lula ou outro aliado mais alinhado ao ex-presidente. O presidente do PT só tem esquecido que sua estratégia pode atingir não só Dilma, mas o partido inteiro.

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