Putin e o envenenamento de Sasha

janeiro 25, 2016.

[caption id="attachment_2707" align="alignleft" width="275"] Sasha Litvinenko, 48 anos, no leito de morte em Moscou, 2016 Sasha Litvinenko, 48 anos, no leito de morte em Londres, 2006[/caption]

A novidade no assassinato de Sasha (Alexander) Litvinenko em Londres foi o emprego pelos agentes da ex-KGB (atual FSB – Serviço Federal de Segurança) soviética do Polônio-210, uma das mais radioativas e letais substâncias, conhecidas como emissoras de raios alfa. Embora tenha sido descoberto por madame Curie no final do século XIX, a utilização do polônio como arma de espionagem surpreendeu o mundo. O crime aconteceu às 5 horas da tarde de 1º de novembro de 2006 no bar do Millennium Hotel, um quatro estrelas no bairro londrino de Kensington. A cápsula contendo uma dose cavalar e suficiente para matar cinquenta pessoas foi colocada pelos agentes Andrei Lugovoi e Dmitri Kovtun (que logo retornaram a Moscou) no chá de Litvinenko, um atleta em pleno vigor físico aos 48 anos de idade que ainda resistiu, mesmo sem conseguir alimentar-se, até o dia 26 quando faleceu num leito do University College Hospital, já pura pele e osso, sem cabelos, parecendo um septuagenário. Toda a operação foi comandada e supervisionada desde o Kremlin pelo presidente Vladimir Putin e pelo então diretor do FSB, Nikolai Patrushev. O diagnóstico do elemento químico mortal foi dado imediatamente após o óbito pelo Serviço de Proteção à Saúde britânico e a investigação agora concluída – e divulgada nesta 5ª feira 21 de janeiro pelo 1º Ministro David Cameron - coube à unidade antiterrorista da Scotland Yard.

A história por inteiro está contada no livro Muerte de un disidente (Ed. Santillana, Madri, 2007) escrito por Alex Goldfarb e por Marina Litvinenko, respectivamente amigo e esposa de Sasha. Os três protagonizaram uma fuga espetacular de Moscou via território turco. Mais tarde ela revelou que Litvinenko seria um agente duplo ligado ao FSB e à Inteligência britânica. Dois dias antes de morrer escreveu uma carta na qual, após agradecer ao pessoal do hospital, à esposa e à polícia inglesa, dirige-se “à pessoa responsável pela minha enfermidade atual. Pode ser que me silencies, mas não te sairá grátis. Tens demonstrado que podes ser tão bárbaro e desapiedado como teus críticos mais hostis já diziam. Não tens respeito nem pela vida nem por nenhum valor civilizado. Mas, senhor Putin, durante o resto da tua vida retumbarão em teus ouvidos os clamores de protesto procedentes de todo o mundo. Que Deus te perdoe pelo que fizeste, não só a mim, mas à minha querida Rússia e a seu povo”.

O começo dessa saga coincide com a administração de Boris Yeltsin que demitiu um antigo diretor do FSB nomeando em seu lugar a um obscuro e inexpressivo agente originário dos quadros de espiões da KGB, que se tornara um habituée do Kremlin: Vladimir Putin. O final dos anos 1990 era um tempo de tensões em Moscou, com a explosão da 2ª. Guerra da Chechênia e os que se opuseram a Putin desde então foram sendo eliminados um a um. Mais conhecidos são os casos da crítica jornalista Anna Politkovskaya baleada em 7 de outubro de 2006 (dia do aniversário de Putin) no elevador do edifício em que residia; do magnata Boris Berezovski enforcado no banheiro de sua mansão nos arredores de Londres em março de 2013, ou de Boris Nemtsov, conhecido adversário do presidente, assassinado a tiros dois anos depois quando caminhava em frente ao teatro Bolshoi em Moscou.

Escolhidos a dedo, os dois executores do atentado contra Litvinenko vivem hoje na capital soviética, protegidos pelo governo que se nega a extraditá-los a Londres onde têm mandatos de prisão decretados. Lugovoi, que era um homem de negócios em visita ao Reino Unido, elegeu-se deputado ganhando imunidade na Duma e no ano passado recebeu a medalha nacional por serviços prestados à pátria. Kovtun, seu amigo de escola, colega de Exército é veterano da espionagem militar na GRU, a unidade de inteligência secreta do Ministério da Defesa.

O bar do Millenniun e os locais por onde carregaram o polônio tiveram de ser isolados devido à intensa radiação. O corpo de Litvinenko foi enterrado em caixão de chumbo. Walter, seu pai, entre soluções declarou: “uma diminuta bomba nuclear matou meu filho”. (VGP)

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