Oh Brasil: Zika persiste, Gripe Suína retorna

abril 07, 2016.

Enquanto o Aedes aegypti resiste bravamente, o vírus H1N1 (que provoca a gripe suína, como era conhecida até 2009, ou Influenza tipo A) depois de um curto intervalo de três anos está de volta. O país, em plena crise econômica e política, com seu sistema de saúde abalado e sob intensa desconfiança da população, busca nas mais antigas tradições de um sistema de saúde pública que já foi exemplar, forças para enfrentar a fúria de velhas e novas epidemias. Vamos por partes. Primeiro as três doenças – dengue, chikungunya e zika – transmitidas pelo Aedes e de tratamento apenas sintomático. O último boletim epidemiológico do Ministério da Saúde fornece um retrato da situação atual.

[caption id="attachment_2855" align="alignleft" width="300"]Aedes aegypti em posição de ataque Aedes aegypti em posição de ataque[/caption]

Neste ano de 2016 já são 397 mil casos de dengue, mais da metade deles na região sudeste. A incidência (número de casos em relação à população) é de 194 casos por 100 mil habitantes, mas as cidades campeãs vão muito além disso: Campanário (5 vezes mais), Coronel Fabriciano e Belo Horizonte em Minas Gerais, Ribeirão Preto em São Paulo. Os chamados “casos autóctones” (contraídos no país) de chikungunya – que felizmente confere imunidade a quem a teve – são 3.748, fortemente concentrados no nordeste com 82% dos casos espalhados por 120 municípios. Já a febre causada pelo vírus zika está presente em 22 das nossas 27 Unidades Federadas e em 24 países da América Latina, onde as exceções são Canadá e Chile, com raros e recentes casos na Argentina e no Uruguai (coincidindo com a menor ocorrência nos estados do sul brasileiro). Suas mais graves consequências possíveis, a microcefalia e a síndrome de Guillain-Barré, fizeram com que Margaret Chan, a diretora da Organização Mundial da Saúde, anunciasse em fevereiro deste ano um estado de emergência mundial, algo que não acontecia desde 2014 no auge do ebola.

A microcefalia, diagnosticada em bebês com perímetro cefálico menor de 32 cm., desde novembro passado tem 6906 casos notificados em 1307 municípios – 78% no nordeste e 12% no sudeste –, com os estados de Pernambuco, Bahia, Rio de Janeiro e São Paulo se destacando. Neste site (www.mundoseculoxxi.com.br), na aba dedicada à ”saúde pública” é possível encontrar vários textos esclarecedores: ‘Microcefalia se multiplica no nordeste”, “Alerta para a disseminação do zika vírus”, “Zika vírus: a nova ameaça”, “A reemergência do dengue”.

O Brasil conseguiu eliminar o Aedes nas décadas de 1950 e 1960, o que lhe permitiu livrar-se da febre amarela, mas a continuidade ficou prejudicada por uma série de fatores como a urbanização que produziu nas cidades um grande número de casas e prédios que precisariam ser inspecionados quatro vezes ao ano, a resistência dos mosquitos aos inseticidas disponíveis,  a precariedade do abastecimento regular de água, da coleta e disposição correta dos resíduos, as condições precárias de moradias em favelas, mocambos, cortiços e invasões, a desarticulação das organizações públicas que ao longo de décadas haviam sido de alta eficácia no combate aos vetores. Pela Lei 8.029 de 12/4/1990, o governo Collor de Mello, numa tragédia anunciada, extinguiu a SUCAM, Superintendência de Campanhas de Saúde Pública e a Fundação SESP. A medida foi executada pelo Secretário de Administração Federal João Santana (o “João Bafo-de-Onça”) e os servidores tiveram de optar entre ir para a então criada Funasa, onde não havia espaço para todos, ou ficar em disponibilidade parcialmente remunerada. Hoje o pessoal de campo em geral é terceirizado e sub-remunerado, tendo pouco compromisso com o bem público e exigindo um padrão de supervisão que é praticamente inexistente.

Se a batalha contra o mosquito transmissor está longe de ser ganha, melhor não é o quadro que se desenha para o esforço nacional direcionado a fazer frente ao vírus H1N1, que nos primeiros três meses do ano já teve 444 casos com alta taxa de letalidade: 71 óbitos, dos quais 55 em São Paulo. A Influenza é transmitida por vírus da mesma família que provoca a gripe comum, da qual se diferencia pela maior severidade de sintomas como a tosse que é seca e contínua, ardor nos olhos, febre de início súbito, dores musculares (mas, em geral não provoca congestão nasal e as dores de garganta costumam ser leves).

A razão para as imensas filas que se estão formando nas calçadas em frente a Postos de Saúde seria a antecipação do surto que era esperado para o início do inverno e a consequente escassez de oferta. Com isso, trava-se uma verdadeira competição olímpica entre as mulheres grávidas em busca da vacina. A vacinação precoce está sendo viabilizada em São Paulo, mas nos demais estados a situação é crítica. O preço de uma dose em clínicas particulares deveria situar-se em torno de R$ 200,00, mas na prática está sendo vendida até a R$ 800,00 (por uma questão de oportunidade, como costumam dizer os mercadores da saúde). Ademais da vacina trivalente que previne, uma semana depois da aplicação, contra os vírus A (H1N1), A (H2N2) e B, acelera-se a produção no Instituto Butantan do Tamiflu, que é indicado para quem adquirir a doença. A prioridade cabe aos idosos, às gestantes, crianças de 6 meses a 5 anos. As unidades do setor público acrescentam os grupos formados por trabalhadores da saúde, povos indígenas e pessoas encarceradas. Espera-se que haja vacina para todo mundo.

Uma discussão que está superada apenas nos países mais ricos diz respeito ao uso do conservante Timerosal por seu elevado conteúdo de mercúrio. De acordo com o professor emérito José Dórea da UNB, “O Timerosal foi retirado de todas vacinas infantis nos países industrializados; permanece somente nos paises subdesenvolvidos. No caso do Brasil, existe exclusivamente na rede publica. As clinicas particulares de vacinação usam as ampolas individualizadas, por isso não necessitam de conservante.  Como um novo e serio obstáculo ao êxito das políticas sanitárias o Ministério da Saúde encontra-se em forte turbulência, tendo os seus cargos superiores, que deveriam ser essencialmente técnicos, ocupados por pessoas com indicação política que se dispõem a apoiar a administração Dilma em sua luta para evitar a decretação do impeachment. (VGP)

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