Nigéria surpreende com mudança democrática

abril 01, 2015.

A oposição venceu as eleições na Nigéria, mostrando à África e ao mundo (inclusive ao Brasil) que a democracia pelo voto é viável mesmo em condições tão adversas quanto as presentes nas margens do Delta do Níger. A vitória de Muhammadu Buhari pelo partido Congresso Todos Progressistas é a primeira vez no país em que um governo é substituído pela via eleitoral. Ele mesmo, um general de 72 anos de idade, conquistou o poder em 1983 através de um Golpe de Estado e foi removido vinte meses depois por Ibrahim Babangida em outro golpe.  Seu período de governo é lembrado por ter colocado na cadeia a centenas de políticos e homens de negócio envolvidos em corrupção, mas também pelos tribunais secretos que promoviam execuções extra-judiciais, pela aplicação da pena de morte a traficantes de droga (e alguns outros adversários) e pela restrição das liberdades civis. Foi castigado pelo povo ao concorrer e perder três vezes nos pleitos de 2003, 2007 e 2011.

Agora, contudo, a permanência de Jonathan Goodluck do Partido Democrático do Povo tornou-se insustentável em meio a escândalos de corrupção ligados à forte indústria nacional do petróleo e ao insucesso no controle do movimento terrorista Boko Haram. No balanço de prós e contras o general Muhammadu é visto como um disciplinador e um dos poucos homens íntegros atuando na política nigeriana. Ganhou com uma diferença de 2,7 milhões de votos neste que é o mais populoso país da África, com 162 milhões de habitantes, 46% das pessoas vivendo abaixo da linha de pobreza e um coeficiente de Gini de 48 pontos (no qual 0 é a igualdade máxima e 100 a desigualdade absoluta) que é sofrível mas, ainda assim, bem melhor que o dos brasileiros (55 pontos).

[caption id="attachment_1850" align="alignright" width="275"] Muhammadu Buhari, novo presidente da Nigéria (www.bellanaija.com) Muhammadu Buhari, novo presidente da Nigéria (www.bellanaija.com)[/caption]

Persiste uma clara divisão, inclusive territorial e religiosa entre o norte de Muhammadu – mais pobre, mais habitado e muçulmano – e o sul de Jonathan que é cristão. A acusação maior ao general é de que ele terminará por radicalizar, implantando a lei da sharia. De qualquer maneira, cerca de metade dos nigerianos segue os preceitos de Alá e é predominantemente sunita. Já os cristãos estão mais estratificados, divididos entre protestantes (75%) e católicos.

No estado de Borno, fronteira com Camarões, Chade e Níger, o Boko Haram formou com sede em Gwoza um Califado que se diz independente. Tão cruel quanto o Exército Islâmico, em sua ação mais sensacional em 14 de abril do ano passado raptou mais de 200 meninas adolescentes numa escola da localidade de Chibok, também em Borno, que até hoje não foram encontradas nem libertadas mesmo com apoio da inteligência norte-americana e de países da União Europeia e embora se saiba que estão, possivelmente em vários pequenos grupos, na floresta de Sambisa que é dominada pelo grupo terrorista. Uma parte delas conseguiu escapar pulando do caminhão que as raptava. Seriam 58, mas podem ser mais considerando que as famílias nada informam por receio de serem atacadas. Conseguirá um governo sunita fazer o que os cristãos foram incapazes de resolver ou, pelo contrário, tentará um acordo cedendo território numa manobra que acabaria por internacionalizar de vez o conflito?

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