As cinzas de Ayotzinapa

novembro 16, 2014.

Mais de quarenta dias foram necessários para que as forças de segurança mexicanas afinal encontrassem os 43 estudantes da Escola Rural de Ayotzinapa, desaparecidos desde 26 de setembro quando a polícia de Iguala os levou. Sabia-se que haviam sido entregues a um grupo criminoso do vizinho município de Cocula, mas só agora três componentes do cartel local “Guerreros Unidos” confessaram o assassinato em massa. Patricio Reyes Landa (“El Pato”), Juan Osorio Gómez (“El Jona”) e Agustín García Reyes (“El Chereje”) descreveram em detalhes o crime. O vídeo (“Cómo incineraron cadáveres em Cocula”), que por seu barbarismo não é mostrado aqui em respeito aos leitores, está disponível no site do jornal Uno Más Uno da Cidade do México no endereço www.unomasuno.com.mex

Os jovens foram conduzidos até o lixão de Cocula. Alguns já chegaram sem vida, mas todos viram-se lançados à parte mais baixa do depósito onde ficaram num círculo que foi cercado com pedras para serem fuzilados com tiros de pistola. Em seguida pedaços de ripa, pneus, gravetos e pneus empapados com gasolina e diesel formaram uma grande fogueira macabra, um inferno que ardeu por quatorze horas.  Por fim os restos, reunidos em oito grandes sacos negros de lixo, foram esvaziados sobre as águas do rio San Juan.  Sem dúvida houve jovens queimados vivos.

[caption id="attachment_1263" align="alignright" width="300"]Lixão de Cocula, onde foram queimados os  jovens de Ayotzinapa Lixão de Cocula, onde foram queimados os jovens de Ayotzinapa[/caption]

O Procurador Geral da República, Jesús Murillo Karam, assumiu a ingrata tarefa de comunicar os fatos aos familiares das vítimas. Estes ainda se negam a aceitar como definitivas as suas perdas, agarrando-se a uma última e desesperada hipótese, de que o laboratório de medicina legal da Universidade de Innsbruck, Áustria, não identifique os restos como sendo dos estudantes. Enquanto isso, a polícia federal capturou o prefeito de Iguala, José Luis Abarca Velázquez e sua esposa María de los Ángeles Pineda Villa, tidos como mandantes do crime e que na noite fatídica divertiam-se numa festa nos arredores da cidade onde ela teve sua candidatura lançada pelo marido para ser a próxima prefeita. Nesse ínterim o governador do estado de Guerrero, Ángel Aguirre, renunciou ao cargo, prefeito e autoridades de Cocula foram detidos e o fluxo turístico para Acapulco sofreu drástica redução pela virtual impossibilidade de vencer os constantes bloqueios promovidos pela população (ou evitar ataques de grupos criminosos) na estrada que dá acesso ao famoso balneário.

Quem são os Guerreros Unidos

Com a desarticulação de carteis da droga devido à pressão policial e militar herdada pelo presidente Peña Nieto do governo anterior, surgiram dezenas ou centenas de pequenos grupos criminosos, na verdade minicarteis como os Guerreros Unidos que operam no estado sulista que lhes dá o nome e também em Morelos e no Estado do México, em torno da capital do país.  Dedicam-se desde 2011 ao tráfico de drogas, à prática de extorsão e ao sequestro.

Sua origem é o megacartel dos irmãos Beltrán Leyva que nos últimos cinco anos sofreu a perda de seu líder máximo Arturo e de dois altos mandos – conhecidos pelas alcunhas de “La Barbie” e “El Indio”. São delinquentes entre 16 e 25 anos descendentes dos grandes carteis, segundo a explicação de Raúl Benitez Manaut, especialista em segurança da Universidade Autônoma do México. Em maio último, o fundador dos Guerreros, “Le Beau Sapo”, foi preso e em seu lugar assumiu “El Chucky” que teria ordenado a captura e morte dos estudantes de Ayotzinapa, presumivelmente em combinação com a mulher do prefeito de Iguala. Os acordos com as autoridades locais fazem parte do modus operandi do grupo que, assim, age sem interferência policial.

Se os Guerreros Unidos estão, agora, em boa parte anulados pelas prisões já efetuadas em Cocula e Iguala, seu principal rival regional no mundo do crime, o cartel “Los Rojos”, também conhecido como “Reds”, igualmente proveniente dos Beltrán Leyva, segue ativo  principalmente em sua especialidade que é o tráfico de medicamentos e estupefacientes.

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